DESAFIOS PASTORAIS EM TEMPO DE PANDEMIA

 

Os sinais que nos dá esta pandemia e o contexto de algum confinamento a que a mesma nos obriga, são interpelações que a Igreja pode e deve saber aproveitar, para estudar, rever, preparar e mesmo ensaiar novos processos de evangelizar. O tempo presta-se para ficar na apatia, cruzar os braços, na expetativa de que surja o levantamento completo dos limites a que o vírus nos força. Mas também é propício para a concentração, constituição e lançamento de viveiros de trabalho, sobre áreas diversas da pastoral, ou para a definição de projetos novos ou reformulados que respondam aos apelos deste novo mundo que vai surgindo de todos os quadrantes da nossa sociedade. Este não é o tempo de nos resguardarmos, para depois continuar o que deixámos quando a pandemia tomou conta de nós, do nosso tempo, das nossas relações, das nossas atividades pastorais. O caminho para uma nova etapa, a forma de perspetivarmos o futuro da ação pastoral, é abrirmos as janelas da novidade e assentarmos os processos evangelizadores em rumos diferentes e mais ambiciosos. O tempo de contingência não nos proíbe de pensar, melhorar, construir e até mesmo ensaiar novos processos pastorais.

A diocese de Beja celebrou um Sínodo entre 2012 e 2016, do qual resultou uma Constituição Sinodal. O documento, talvez a precisar de mais atenção e estudo, dedica um capítulo à «Igreja que queremos ser». Nele se reconhece que «o tempo de cristandade passou» e diz mesmo que «hoje, não adianta pensar em remendar o tecido da Igreja, pois trata-se de a refundar, de fazer um novo tecido eclesial». Mais adiante, afirma que «precisamos de aprender a celebrar e a viver a Liturgia como assembleias celebrantes e não como assistentes passivos». No capítulo anterior, dedicado ao Mistério da Igreja, afirma-se que «a Igreja é, por sua natureza, missionária» e que o mandato de Jesus de «ir por todo o mundo anunciar o Evangelho a toda a criatura, constitui e manifesta a Igreja».

Assim, ao nível dos documentos, estão perspetivados tempos novos a exigir processos novos de ação pastoral. Mas cada ano que passa, os «Programas Pastorais» parecem ou não responder ao que é pretendido, ou não conseguem cativar e mobilizar os agentes da pastoral, para vias de ação que permitam «refundar, fazer um novo tecido eclesial» na diocese. Assim sendo, algo precisa de mudar e este é o tempo de o fazer.

A diocese de Beja tem cento e dezanove paróquias e três vicariatos. Em teoria, dispõe de quarenta e sete padres diocesanos e sete religiosos. Mas, dos quarenta e sete diocesanos, quatro já não estão no ativo e cinco encontram-se fora da diocese. A média etária é de 56,02 anos. Isto significa que, para responder pastoralmente à evangelização das suas populações, a diocese conta, efetivamente, com quarenta e cinco padres. Por outro lado, além das cidades e vilas, as pessoas estão dispersas por pequenos núcleos populacionais e as distâncias contrastam com o número de pessoas que vai diminuindo nos meios mais pequenos.

A este clero reduzido, algum idoso e ao que sai das escolas superiores, exige-se uma formação inicial e permanente capaz de «refundar» essa Igreja missionária, esse «novo tecido eclesial», neste difícil contexto diocesano.

Neste tempo de contingência, não haverá disponibilidade para revisitar as propostas de uma Constituição que exprime o pensar da própria Igreja diocesana que se quer «refundar»? Que falta aos Órgãos Colegiais diocesanos ou que alma devem ter, para estudar, sugerir, incentivar e acompanhar, com redobrado esforço e interesse, novos processos de ação pastoral para as comunidades e com as comunidades? Só um arrojado compromisso missionário dos agentes da pastoral, poderá superar, com êxito, as dificuldades que se depreendem da situação acima referida.

O Vaticano apresentou em Junho passado um novo Diretório da Catequese com um rico conteúdo orientador, muito para além do que se continha nos dois anteriores. A opção missionária da catequese, essa centralidade do «Kerigma», é a grande novidade deste Diretório. Se a catequese já se apresentava com a finalidade de proporcionar o encontro, a comunhão com a pessoa de Cristo, este Diretório acrescenta-lhe «o acompanhamento no amadurecimento desta resposta». Para levar os agentes da pastoral a compreender e assumir na sua prática, estes e tantos outros objetivos da catequese, a diocese precisa de se mobilizar para o seu estudo e para implementar novos processos que concretizem, nas comunidades, o que ali se propõe.

O silêncio criador, o recato a que a pandemia nos obriga, propiciam o estudo, a constituição de viveiros de reflexão, a construção e o ensaio de processos de evangelização, virados para fazer um novo tecido eclesial na diocese. Não desprezemos esta oportunidade.

  

António Domingos Pereira

 

 

 

 

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