Renascer em tempos de crise

Nestes tempos de prevenção e luta contra o Coronavírus, COVID – 19, a impossibilidade de nos reunirmos fortalece a consciência da importância das multiplicas e diversificadas reuniões eclesiais: Eucaristia diária e principalmente ao domingo, Catequeses, preparação e celebração dos Baptismos e Casamentos, bem como a celebração da Reconciliação e da Unção dos Enfermos, a par da atividade própria dos Secretariados, Serviços e Movimentos. Do mesmo modo que valorizamos mais a saúde quando estamos doentes, a experiência atual da Igreja torna manifesto quanto éramos presentes na vida da sociedade e da Igreja.

Sem dúvida, a generalidade dos Párocos já sente a profunda falta do encontro com os agentes pastorais, a ausência do atendimento quotidiano, a calendarização e celebração dos sacramentos (Baptismos, Casamentos, Reconciliação, Unção dos Enfermos) e principalmente a celebração comunitária da Eucaristia. No entanto, e porque acreditamos que “tudo concorre para o bem daqueles que amam o Senhor”, vivemos um tempo de reflexão e aprendizagem que poderá frutificar em novas formas de presença e acção pastoral.

 

Conforto e esperança

Ao longo da história, desde à dois mil anos, a Igreja sempre foi local seguro para que as populações encontrassem conforto e esperança, quer em tempos de paz, quer em épocas de invasões e no meio de guerras, perseguições e doenças, incluindo tempos de pandemias. A este propósito, basta lembrar:

Nos Primórdios do cristianismo

A fraternidade, a partilha e o bem comum; o apelo e a realidade do “viver como irmãos”, como alternativa à “sociedade dos senhores e escravos”; o acolhimento, em pé de igualdade, de homens, mulheres e crianças; o reconhecimento do Domingo como “dia feriado” (a partir do ano 325), a proibição do adultério com uma escrava, a interdição de separar as famílias dos escravos e o tratamento mais humano nas prisões. Mais tarde (séc. II-IV), fortes apelos à dignidade humana, ao respeito pelas pessoas e defesa dos pobres, entre outros, por parte de Gregório de Nissa, Gregório de Nazianzo e S. João Crisóstomo.

Na Idade Média (séc. V-XV)

Quando muitos pensaram que tinha chegado o fim do mundo, a partir da Igreja organizou-se uma nova vida social, económica e também política. A Igreja sempre permaneceu junto das populações e estas, a ela recorreram procurando alívio, refúgio, conforto e salvação. A história não pode esquecer que, aquando das denominadas “invasões bárbaras” a Igreja continuou a ser a única instituição organizada e as Igrejas e Mosteiros foram centros de estabilidade e de paz.

No Renascimento e Descobertas (séc. XV-XVI)

S. João de Deus, natural de Montemor-o-Novo, dedicou-se ao serviço dos doentes e, Vicente de Paulo, fundou as Filhas da Caridade para que vivessem junto dos mais pobres (1563). Paralelamente, outros trabalharam incansavelmente em hospitais, asilos, escolas e missões (Bartolomeu de las Casas, António Vieira e Pedro Claver, entre outros, tornaram-se os defensores dos índios e condenaram a escravatura). A luta contra o sofrimento humano foi uma constante e apostou-se na formação e educação das crianças, adolescentes e jovens.

Na Revolução Industrial (séc. XIX)

O triunfo de uns poucos fez surgir dolorosas dificuldades que não deixaram indiferente a consciência e a acção de muitos cristãos. Como consequência, surgiram as obras de assistência por parte das Conferências de S. Vicente de Paulo (1883), as Reuniões de Operários da Sociedade de S. Francisco Xavier (1840), a Sociedade Salesiana (1859) e os Irmãos das Escolas cristãs que vieram a organizar o núcleo fundador do sindicalismo cristão (1877). No séc. XIX foi manifesto o contacto da Igreja com as realidades da discriminação e da pobreza, quer indo às raízes, quer apontando soluções para os problemas surgidos, principalmente no mundo do operariado. Surgiu a doutrina Social da Igreja, principalmente com o Papa Leão XIII, com tal força que, até aos nossos dias, todos os seus sucessores sentem necessidade de lhe dar continuidade, na fidelidade ao Evangelho e procurando responder aos novos e constantes desafios.

Conflitos internacionais (séc. XX)

Foi notável a acção humanitária da Igreja durante a I Guerra Mundial (1914-1918), preocupada com a troca dos feridos e a assistência religiosa dos capelães militares, entre eles, aquele que foi bispo de Beja e é conhecido como o “bispo-soldado”, D. José do Patrocínio Dias. Muitos foram os apelos à paz, por parte de Bento XV e, na II Guerra Mundial (1939-1945) estes apelos continuaram, juntamente com o repúdio dos horrores cometidos: “A execução das medidas de deportação que procedem atualmente contra os judeus dá lugar a cenas tão dolorosas que temos o imperioso dever de elevar o protesto da nossa consciência. Assistimos a uma dispersão cruel das famílias onde nada é poupado: nem a idade, nem a fraqueza, nem a doença. Aperta-se-nos o coração ao pensarmos nos maus-tratos infligidos a milhares de seres humanos e mais ainda se pensarmos nos que não podemos prever” (Cardeal Pedro Gerlier, Bispo de Lião).

Em Tempos de Coronavírus - 19

Neste momento, a acção da Igreja não pode ser diferente! É preciso que a humanidade continue a contar com o testemunho da “família de Deus”. O Papa Francisco, desde o início do seu Pontificado não cessa de apelar para que a Igreja continue a ser uma presença viva do amor de Deus junto dos mais pobres.

Em Portugal, a Igreja compreendeu rapidamente a gravidade do problema, causado pelo COVID -19, mesmo antes de ser considerado uma pandemia e tomou a decisão dolorosa de suspender a própria celebração comunitária da Eucaristia. É impressionante como os nossos bispos, sacerdotes e o povo de Deus em geral têm rapidamente reagido diante da batalha que se trava contra este vírus. Continuemos assim porque Deus sabe que pode contar connosco e com sua Igreja. 

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